Café não é só uma bebida, café é um estilo de vida. Será que vale tomá-lo apenas para acordar ou se manter acordado.
Se esse for seu motivo, além do café, temos outras fontes de energia, mas por que ele é o escolhido por tantas pessoas? Porque é uma delícia e traz dezenas de referências da nossa história, pessoal ou cultural.
A qualidade dos grãos é mais relevante no resultado da sua bebida final que o método que você usa. Pois bem, o que define um café de qualidade? Como escolher o que vai parar na minha xícara.
Acredito em escolhas conscientes. Por isso, apresentarei os três tipos de café encontrados no mercado e porque você deveria escolher o café especial… 😉
Tradicional x gourmet x especial
Para quem realmente aprecia um bom café, ver a crescente variedade de opções nos mercados, redes sociais e lojas especializadas parece um sonho. Mas é aí que as coisas se complicam. São tantos rótulos, safras e preços tão distintos, que fica difícil saber por onde começar.
Normalmente, encontramos os café tradicionais e alguns gourmet em qualquer supermercado, padaria e em algumas lojas especializadas. Já o café especial, é encontrado em cafeterias e para a nossa sorte, em muitas lojas virtuais, temos uma boa lista aqui.
Como distinguir cada um destes tipos de cafés? Como escolher? Esse é o ponto de partida desse artigo. Até o final você terá as ferramentas necessárias para fazer uma ótima escolha.
Café tradicional
O café tradicional é aquele que você conhece melhor. Vendido em pó nos supermercados e em tudo que é lugar, ele normalmente é embalado à vácuo e tem um prazo de validade longo. Sua coloração é muito escura, tanto quando está em pó quanto a bebida final.
Esse café pode ser um blend entre arábica e robusta (duas espécies diferentes de café), isso faz diferença na experiência sensorial da bebida, já que o robusta tende a ser mais forte e amargo, em contrapartida da sua total falta de complexidade de sabores.
Para a nossa alegria também existe no mercado a opção de 100% arábica, que traz mais sabor e qualidade à bebida.
O que transforma esse café na pior das opções para você é que todo o processo de produção desse tipo é feito em larga escala. Ou seja, desde a colheita até a torra, não há cuidado nem atenção à qualidade do que será oferecido.
Café gourmet
O café considerado gourmet é o mais difícil de classificar, já que não há regulamentação que defina os critérios para que um café seja considerado gourmet.
Ainda assim, o gourmet tem tendência a ser mais saboroso que o tradicional. Os processos de produção são mais cuidadosos e as embalagens são mais bonitas.
No entanto, por não haver protocolo mundial, não existem muitos meios de atestar a sua qualidade, nem que ele foi realmente produzido com mais dedicação.
Temos cafés ditos gourmets em pequenas torrefações, mas também em grandes corporações. Portanto, se você quiser muito provar um café gourmet, go local e privilegie uma marca menor.
Café especial
Chegamos à vedete deste artigo. O maravilhoso, saboroso, belo e complexo café especial. Apesar de sempre tentar fugir dos argumentos técnicos ao tentar falar de café, nesse caso, será importante inserir algumas informações sobre o que torna o café produzido em um café especial.
Não é o produtor, nem a torrefação, nem a loja que define que aquele pacotinho de café está repleto de grãos especiais. Essa classificação depende do protocolo da SCA (Specialty Coffee Association), que além de definir os critérios do protocolo, também tem o objetivo de difundir e fomentar a cultura do café especial no mundo.
O processo de avaliação da SCA analisa diversos parâmetros, desde sabor até processo de produção, gerando uma pontuação entre 0 e 100 pontos. Só são considerados cafés especiais aqueles que atingirem no mínimo 80 pontos.
Portanto, se seu café estiver rotulado como especial, saiba que ele passou por uma extensa e rigorosa análise e tirou nota alta, ou seja, pode confiar.
Café especial, processos especiais…
PLANTIO
O plantio do café especial é especial, obviamente. Para a espécie arábica se desenvolver no seu potencial completo há de se escolher bem o terreno, altitude, umidade média e temperatura.
A árvore arábica não tolera geadas, nem floresce em temperaturas extremamente altas. Isso significa que ela cresce melhor em certas regiões montanhosas e bem irrigadas dos trópicos. Os cafés arábica de alta qualidade são cultivados em altitudes acima de 800m, acima do nível do mar, geralmente entre 1500 e 2000m.
COLHEITA
Bom, é importante lembrar que café é uma fruta e como todas as frutas, passa por um processo de amadurecimento. E quem já viu um pé de qualquer fruta já viu que o amadurecimento não é algo organizado e homogêneo.
Cada fruta tem seu tempo e se desenvolve de maneiras diferentes no pé.
A colheita dos cafés especiais leva isso muito a sério. O processo é quase sempre manual selecionando somente as cerejas (como se chama o fruto do café) maduras para virarem bebida.
O que é diferente das colheitas feitas por máquinas das grandes corporações que colhem tudo que está no pé, seja frutas verdes, maduras, secas ou até, podres.
SECAGEM
A secagem é mais uma forma de deixar a bebida na sua xícara com mais sabor. Os produtores testam as melhores formas e definem qual vai usar na sua fazenda e isso vai depender da estrutura disponível, da variedade do grão, do sabor que está sendo procurado.
Além disso, é mais uma forma de selecionar os melhores grãos.
Para tanto, temos duas alternativas: a via seca e a via úmida. Na seca, o café não lavado tem as impurezas tiradas através de peneiras. Em seguida, ele vai para a ventilação e assim, se separa o café seco do café verde.
Na úmida, retira-se os micro-organismos que influenciam de forma negativa na qualidade do produto. Nessa etapa, retira-se do café cereja o mesocarpo (que é a mucilagem açucarada) e a casca.
BENEFICIAMENTO
No beneficiamento, mais uma vez, são retiradas impurezas, caso tenha sobrado alguma. Estão contando? Já é o terceiro processo que seleciona os melhores frutos!
Nessa etapa são retiradas pedras e galhos que possam ter ficado junto aos grãos, usando peneiras e catadores de pedra.
Após essa limpeza, o grão é descascado e só agora entra na etapa de classificação. Aí são pelo menos 3 testes para tentar encontrar defeitos, isso mesmo, é defeito que eles querem eliminar antes mesmo de classificar as qualidades.
Aí sim partem para a análise sensorial, feita por provadores profissionais formados e treinados para captar tudo o que a gente não é capaz quando tudo que queremos é tomar uma xícara de café.
O blog da UCoffee explicou brevemente os critérios utilizados:
- Fragrância/Aroma – Critério de avaliação do “cheiro” do café. É feito em duas fases: a análise da fragrância, como é chamado quando é analisado seco e a análise do aroma, quando é analisado úmido. Nesta primeira fase já se começa a entender o perfil do café, pois, dependendo de sua produção, o grão pode desenvolver um sabor mais frutado, floral ou até mesmo de especiarias.
- Sabor – Envolve a sensação gerada na boca, fazendo a sucção da bebida por meio de uma colher especial para a prova – o barulho de sugar a bebida nos parece bem feio, mas faz parte do processo de análise.
- Finalização ou sabor residual – Aborda o sabor que a bebida deixa na boca após o consumo; quanto mais o sabor se manter presente, melhor a pontuação.
- Acidez – É um dos fatores de composição da sensação da bebida que faz diferença – todos os cafés tem um pouco, o importante é ser um sabor equilibrado neste e nos demais critérios de sabor.
- Corpo – Esta avaliação considera a forma que o café transita na boca, pontuando o café que o fizer de forma mais suave.
- Balanço – É a média entre os quesitos 2 a 5. O equilíbrio também é um critério de avaliação, pois a bebida é uma composição de sabores e sensações, não podendo destacar ou anular um dos critérios
- Uniformidade – A prova consiste na degustação de cinco xícaras do mesmo lote, e caso o café demonstre sabores diferentes de uma xícara para outra, é descontada uma pontuação.
- Doçura – O café tem açúcares naturais em sua composição, e este também é um critério avaliado na bebida, que deve ser naturalmente doce. Inclusive, quando bem preparada, você consegue perceber esta doçura natural.
- Xícara limpa – A amostragem também não pode apresentar erros ou defeitos, considerando inclusive os critérios do sabor e odor.
- Geral – Este critério contempla a degustação como um todo, pois o profissional é treinado suficientemente para classificar uma boa experiência com a amostragem.
São avaliações técnicas, sem considerar gosto pessoal. E para ser aprovado e carimbado como café especial, o cafézinho tem que convencer 3 desses profissionais. “Fácil”, né?
TORREFAÇÃO
A torra dos grãos é mais uma das grandes diferenças do café especial. Usando torras mais claras, pensadas e definidas de forma científica para acentuar o sabor e preservar as notas de sabor, os torradores de café especial são altamente capacitados e justamente responsabilizados pelas bebidas incríveis que entregam.
A torra escura que estamos acostumados nos cafés tradicionais, é usada para encobrir as características negativas da matéria prima, ou seja, para cobrir os defeitos do café verde, do podre, da secagem menos cuidadosa e da falta do controle de qualidade baseada em sabor. E assim entregam uma bebida sem complexidade e com muito amargor.
MOAGEM
Já dizia uma grande cafeteria de cafés especiais em São Paulo, “moeu, f***”. Essa máxima é levantada sempre que falamos da qualidade do grão. No momento que o café é moído, o ideal é que ele seja feita na hora.
Os paladares menos treinados podem não notar de imediato, mas quanto mais tempo que o café foi moído, mais ele perde o sabor e todas as suas propriedades.
Claro, que se você não puder ter um moinho em casa, comprar moído ainda é melhor que não ter café de qualidade em casa.
Mas atenção para o método de extração que vai usar! Para cada forma de extração existe uma granulometria ideal!
Agora você entende?
Além de todos os processos de produção, o mercado de cafés especiais tem outras vantagens. Em geral, você compra de torrefações pequenas e ajuda o comércio local.
Essas torrefações compram a matéria prima de fazendas com produção familiar ou de cooperativas formadas por produtores de uma região, ajudando no desenvolvimento de processos e pagando de forma justa.
A preocupação com a sustentabilidade de todo o sistema vem desde as associações reguladoras até o consumidor final.
Você consegue rastrear a origem do produto que está consumindo, normalmente, na embalagem, você consegue saber de qual país seu café vem, de qual fazenda, quem foi o produtor, qual o processo de secagem, até a altitude que as árvores foram plantadas.
Assim como em outros mercados, há pessoas que não gostam ou não estão dispostas a arcar com o custo de um café especial, como eu disse no início, acredito em liberdade de escolhas.
Longe de mim tirar a praticidade do seu dia a dia. É claro que passar numa cafeteria e sair com um copo enorme de café para viagem também faz parte do meu cotidiano. O que estou propondo é a inclusão de um novo ritual e vários novos sabores, quando você for fazer aquele cafézinho em casa..